quinta-feira, 28 mar 2024

Água na agricultura e produção de alimento

Água na agricultura e produção de alimento

22 março – 2021 | 8:08

Lineu N. Rodrigues – pesquisador da Embrapa Cerrados (DF)

No dia 22 de março, celebra-se o Dia Mundial da Água. É uma oportunidade para se discutir a importância desse recurso para a vida e para o desenvolvimento econômico e social. É fundamental que o tema seja analisado dentro das suas várias dimensões, sendo preponderante adotar estratégias de manejo que considerem os recursos hídricos de forma integrada, e que almejem uma alocação equitativa, considerando os usos múltiplos da água e a bacia hidrográfica como unidade de referência. Água é sinônimo de dialogar, de compartilhar e de integrar. Não é geradora de conflitos, mas sim de oportunidade para produzir e de criar desenvolvimento.

Nesse contexto, não teria como não aproveitar a oportunidade de trazer para a reflexão o tema água na agricultura e produção sustentável de alimento. Segurança alimentar e hídrica estão no centro das maiores preocupações da sociedade. A água é o principal fator de produção de alimentos. Como balancear produção de alimento e demanda hídrica em um mundo onde cerca de 820 milhões de pessoas não têm acesso à quantidade de alimento suficiente para manter níveis básicos de saúde e onde dois terços da população enfrentarão algum problema de falta de água é o grande desafio a ser enfrentado.

A relação água-alimento é complexa. Esses dois elementos estão intrinsecamente e fortemente interconectados. A complexidade inerente a essa interação é um dos motivos dos debates e disputas, muitas vezes desnecessárias, entre os setores usuários. Mantidas as condições atuais, o aumento na produção de alimentos demandará mais água e poderá aumentar ainda mais as disputas pelo uso da água, reduzindo a qualidade de vida da população. É nesse sentido que a ciência tem papel fundamental. As inovações modificam a situação atual, possibilitando produzir mais sem aumentar as demandas hídricas.

Atender as demandas atuais e futuras por alimento vai requerer um rápido aumento de produtividade, que precisa ser alcançado sem danos adicionais ao ambiente. Para que isso ocorra, é fundamental que os princípios de sustentabilidade sejam parte central das políticas agrícolas. As pessoas estão, em sociedade, cada dia mais conscientes sobre as questões ambientais e têm optado, de forma crescente, por alimentos produzidos nessas bases sustentáveis.

Nesse sentido, o objetivo de produzir mais alimentos deve ser visto dentro de uma abordagem mais ampla, considerando os aspectos de sustentabilidade ambiental, ou seja, buscando produzir mais alimentos com melhor qualidade e com menores danos aos recursos naturais. Para isso é necessário intensificar a agricultura de maneira sustentável e melhorar a eficiência dos sistemas agrícolas, tornando-os mais produtivos. Qualquer estratégia que vise intensificar a agricultura, reduzindo a variação na produção e aumentando a produtividade das culturas, deve necessariamente incluir a irrigação.

A irrigação é tecnologia essencial no xadrez da produção de alimentos. Atualmente, com a variabilidade climática cada vez mais acentuada, não se pode pensar no desenvolvimento de uma política de segurança alimentar e de segurança ambiental que não estabeleça políticas de longo prazo para o desenvolvimento da agricultura irrigada.

No mundo, a agricultura irrigada é responsável por cerca de 40% de toda a produção, viabilizando produzir fisicamente, em uma mesma área, até quatro vezes mais que a agricultura de sequeiro. A grande vantagem da agricultura irrigada, entretanto, está em trazer estabilidade para a produção, o que possibilita planejar estratégias de segurança alimentar e propor políticas públicas de médio e longo prazo.

O desenvolvimento de uma agricultura sustentável passa, necessariamente, pelo uso sustentável dos recursos hídricos, que por sua vez, depende de uma gestão que incorpore os usos múltiplos da água e considere os fundamentos e diretrizes da Política Nacional de Recursos Hídricos. Não se pode pensar em agricultura e desenvolvimento sustentável sem que haja um equilíbrio entre a oferta e a demanda de água. O Brasil é um país de dimensões continentais com grandes diferenças sociais, ambientais e econômicas, o que deixa a atividade de gestão muito mais complexa. Fazer a gestão de recursos hídricos de forma igualitária em todo o País pode levar a conflitos em bacias hidrográficas que já se encontram em estado crítico em termos de disponibilidade hídrica.

A água tem diversas formas e recebe diferentes nomes. A água na agricultura é sinônimo de produção de alimento e segurança alimentar. Aparentemente, a quantidade de água doce renovável anualmente no mundo é muito maior que a quantidade de água necessária para sustentar as demandas dos três usos consuntivos de água (abastecimento doméstico da população; produção industrial; e produção agrícola sob irrigação). Dentre esses usos, a agricultura irrigada é o único que faz uso tanto da água verde (água proveniente da chuva e armazenada no solo) quanto da água azul – água existente nos rios ou aquíferos. Em países tropicais como o Brasil, a água verde representa um componente significativo para a produção e estratégias devem ser desenvolvidas para maximizar o seu uso.

O crescimento das áreas irrigadas, entretanto, não pode mais ser fundamentado apenas no aumento do uso de recursos hídricos. O crescimento desejado e possível é cada vez mais dependente dos ganhos de eficiência nos sistemas já existentes. O desafio da agricultura irrigada é a promoção do irrigar com qualidade. Isso quer dizer que deve ser buscada continuamente uma elevada eficiência e produtividade de uso das águas. A agricultura irrigada deve ser capaz de utilizar os recursos de forma eficiente, com mínimas perdas e deterioração da qualidade da água. Neste cenário, a agricultura irrigada terá a grande oportunidade de contribuir para a segurança ambiental, hídrica e alimentar, podendo ainda contribuir para reduzir os impactos na produção advindos das mudanças climáticas, garantindo alimento em quantidade, qualidade e a custos acessíveis para as pessoas.

As retiradas de água dos mananciais, necessárias para garantir a prática da agricultura irrigada, devem estar previstas nos planejamentos estratégicos, especialmente em cronogramas existentes nos planos de recursos hídricos, conforme as condições climáticas, a vocação dos cultivos regionais, as potencialidades das áreas produtivas e os mercados consumidores e, posteriormente, consolidadas por meio da definição de planos de concessão de outorga de uso de água para irrigação, possibilitando que seja feita uma gestão compartilhada em cooperação e a prevenção com redução dos conflitos.

No olhar da gestão quanto à oferta, deve-se considerar as desigualdades hídricas regionais e ter um olhar diferenciado para as bacias hidrográficas críticas, onde a disponibilidade hídrica já está comprometida, assim como onde a ocorrência de conflitos pelo uso da água já é realidade. No olhar da gestão quanto à demanda, a irrigação precisa de uma gestão com olhar ampliado. O produtor precisa ter uma visão além de sua propriedade e de sua área de produção. É preciso ter sempre uma visão macro da bacia hidrográfica. A irrigação tem que ser feita considerando a bacia hidrográfica. O rio é, na verdade, reflexo daquilo que acontece na bacia como um todo. Ou seja, é preciso olhar a bacia de forma mais integrada, considerar estratégias de conservação de água e solo, que vão refletir diretamente na quantidade e na qualidade das águas.

O Brasil, com 12% da água doce superficial disponível no planeta e 28% da disponibilidade as Américas, é estratégico para suprir o aumento de cerca de 60% da demanda por alimentos, necessários para atender a uma população mundial que em 2050 será de aproximadamente 10 bilhões de habitantes. O sucesso dependerá da capacidade da sociedade em entender estrategicamente o nexo água-alimento. Para responder

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